sexta-feira, 23 de julho de 2010

Discurso de Jackson Cavalcanti Junior em homenagem ao GATHO, 23 de julho de 2010 - Câmara de Olinda

Por: Jackson Cavalcanti Junior



Boa noite a todas e todos!

Saúdo a Mesa nas pessoas de Rinaldo Almeida, como eu um dos fundadores do GATHO; do vereador Jorge Prestanista, presidente da Mesa; do vereador Marcelo Santa Cruz, autor da homenagem; Delma Silva, representante do Centro de Cultura Luiz Freire - CCLF e do Movimento Nacional de Direitos Humanos em Pernambuco - MNDH-PE e da Drª. Maria das Graças, representante da OAB de Olinda.

Senhoras e senhores.
Há trinta anos surgia o Grupo de Atuação Homossexual, o GATHO, aqui em Olinda, no Centro de Cultura Professor Luiz Freire. Iniciando, efetivamente, numa reunião de quatro amigos, acontecida no dia 12 de maio de 1980: José de Albuquerque Porciúncula Filho – Zé Popó, Sávio Regueira, Rinaldo Pereira de Almeida e João Antônio Caldas Valença que, preocupados com os assassinatos de homossexuais do Recife: o do pianista do antigo Grande Hotel, Bamba; do bailarino Tony e do médico Marcos e, principalmente, com o tratamento dispensado pelos jornais do Recife na época.

Esses quatro amigos resolveram chamar outros amigos, que chamaram outros amigos e assim chegava eu, aos 21 anos, levado por dois amigos da UFPE, Antônio Carlos – Tonhão, e Nélson Correia dos Anjos e entrei de cabeça, tronco e membros no grupo. Foram dias difíceis aqueles. Sempre escrevíamos aos jornais, reclamando do tratamento dado, principalmente com relação ao Diário da Noite, o mais ferrenho defensor dos assassinos e que chegou a estampar em sua capa: “ERA SÓ O QUE FALTAVA: FUNDADO O SINDICATO DE VEADOS”, em resposta ao nosso Manifesto contra os assassinatos e também contra o tratamento dispensado pelos noticiosos.
É lamentável que ainda hoje se assassinem pessoas somente pelo fato de ser o que se é. Ao que me conste, ninguém até agora foi assassinado por ser heterossexual.

É muito bom que esta Casa hoje abra suas portas para homenagear um grupo que não mais existe, mas que foi o primeiro grupo de Pernambuco a se levantar contra a violência cometida contra homossexuais. Esta Casa (é importante que se informe), em 1983, por iniciativa de um vereador que também defendia os nossos direitos, Fernando Gondim, aprovou Moção de Repúdio à observância do famigerado código 302.0, da Classificação Internacional de Doenças, de responsabilidade da Organização Mundial de Saúde, que taxava a homossexualidade como “Desvio e Transtorno Sexual”. Em 09 de fevereiro de 1985, o Conselho Federal de Medicina tornava sem efeito, no Brasil, esse código 302.0. É importante registrar que a OMS somente retirou a homossexualidade da sua lista de doenças em 1992, no dia 17 de maio, que ficou conhecido mundialmente como o Dia Internacional Contra a Homofobia e que o presidente Lula recentemente emitiu instrumento legal instituindo esse dia aqui no Brasil.
Durante a elaboração da Lei Orgânica de Olinda, esta Casa também avançou, pois a nossa Lei Orgânica, promulgada em 03 de abril de 1990, explicita:

“Art. 7º. Todos têm direito de viver com dignidade.

§ 1º. Ninguém será discriminado, prejudicado ou privilegiado, em razão de nascimento, idade, etnia, raça, cor, sexo, estado civil, ORIENTAÇÃO SEXUAL, atividade profissional, religião, convicção política e filosófica, deficiência física, mental e sensorial ou qualquer particularidade, condição social ou ainda, por ter cumprido pena.”

Posteriormente, em 1999, por iniciativa do vereador Marcelo Santa Cruz promulgou a Lei nº. 5168/1999, que estabelece penalidades aos estabelecimentos que praticarem atos de discriminação e já neste século, por iniciativa do vereador Ula, foi aprovada a Lei nº. 5443, de 28 de julho de 2005, que institui o dia 28 de junho como o Dia Municipal do Orgulho e Consciência Homossexual no Município de Olinda.

Muito recentemente, a Argentina deu um grande salto na sua legislação, felizmente para a comunidade LGBT argentina. Aqui, alguns candidatos confundem casamento civil com sacramento religioso. Ora, é preciso que nossos representantes se lembrem que não legislam para suas paróquias, mas para toda a sociedade. Temos que entender que não se pode reger a sociedade de acordo com as convicções religiosas de uns. Religião é questão de fé, de foro íntimo. Ninguém pode ter o direito de sobrepujar outros credos ou não-credos em prol de uma única denominação religiosa! A Igreja, meus amigos, deve ater-se a um papel apenas no campo da fé, mais nada. Isso fica para os templos. Mas os representantes do povo têm um papel a desempenhar no campo da democracia, mesmo que sejam religiosos, devem saber separar as coisas: fé é fé. É por isso que o nosso Código Civil deve ser alterado, uma vez que o casamento civil deve ser entendido não como uma questão religiosa, mas como uma questão vinculada aos direitos civis dos cidadãos e cidadãs, afinal casamento deve ser entendido como um direito dos seres humanos e não como apenas um privilégio de heterossexuais.

A luta continua. Temos que batalhar muito ainda pela aprovação da lei contra a homofobia e também por uma Lei da Igualdade, nos mesmo moldes das legislações da Holanda, Bélgica, Espanha, Canadá, África do Sul, Noruega, Suécia, Portugal, Islândia e Argentina.

Podemos afirmar que o GATHO marcou época no desabrochar da luta dos movimentos libertários da política sexual, com determinação e garra contra o preconceito homofóbico e a discriminação, destituída de qualquer base científica, mas nem por isso menos opressora. Nosso grupo não chegou a se tornar uma organização institucionalizada, mesmo tendo publicado o extrato do seu seu estatuto, no Diário Oficial do Estado, no dia 09 de novembro de 1985, mas, por controvérsias internas a respeito da sua oficialização, desarticulando-se ainda em fins de 1985, contudo tendo atuado de forma acanhada até 1989. Podemos ter certeza que a lição que deixou ainda hoje fomenta a história de vários cidadãos e cidadãs LGBT, despertando o sentimento de respeito por si. Conscientizando-o que pode e deve ser visto como alguém igual a qualquer outro, mesmo sendo diferente. Afinal todos os seres humanos têm, entre si, diferenças físicas, culturais, comportamentais e sexuais significativas. Ser diferente não é ser melhor nem pior. É apenas ser!

Antes de encerrar, quero fazer uma homenagem aos nossos companheiros de luta que já morreram: Bernot Sanchez, Zé Popó, Onildo Leite, Sávio Regueira, Wilma Lessa, João Antônio Mascarenhas, David, Roberto de França, o nosso Pernalonga, entre outros que conosco caminharam lutando. Companheiros de hoje, a nossa luta não acabou. Continuará sempre até que tenhamos conquistado os nossos direitos fundamentais.

Muito obrigado.

Jackson Cavalcanti Junior

Um comentário:

  1. Foi com o maior prazer do mundo que me deparei com esta publicação do meu texto neste Blog do Fórum LGBT, pois não sabia que havia sido publicado além do meu blog.
    Obrigado, companheiros!

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